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- Publicado: 10/05/2021
- Categoria: Informação
Escolher ginecologista: homem ou mulher?
Há uns tempos a minha filha perguntou-me o que faria um homem querer ser médico ginecologista.
Achei pertinente a questão à qual não soube responder.
“Será que há muitas mulheres em Urologia?” – pensei…
Dei por mim a recordar a minha história e a aperceber-me que sempre tive médicas – sendo que a atual foi minha obstetra e é minha médica há quase 20 anos – apesar de ter crescido a ouvir que os ginecologistas homens são “mais cuidadosos”, “mais gentis” e “melhores ouvintes” e de ter amigas que repetem tudo isto ainda ao dia de hoje…
Torço um bocado o nariz a estas generalizações.
Soam-me sempre àquelas coisas que passam de geração em geração e que repetimos sem pensar, sobretudo quando é para minimizar prestações femininas.
Sim, também já tive uma ginecologista péssima que me tratou mesmo mesmo mal – e uma outra que no meu instagram me desejou que apanhasse COVID – mas maus profissionais e más pessoas existem em todas as profissões e não me parece justo generalizar que “as médicas ginecologistas são [whatever]…” e que os médicos “são mais [introduzir característica positiva] que elas”.
Há dez anos, as mulheres no Reino Unido pareciam não declarar uma preferência; uma minoria que escolhia homens dizia que estes “compreendiam melhor os seus problemas” , e as mulheres não-brancas, com rendimentos e nível mais baixo de escolaridade preferiam ginecologistas mulheres.
Em 2017, no Congresso Anual de Ginecologia americano foi apresentado um estudo que revelou que as mulheres ginecologistas tinham 47% menos probabilidade de receber uma boa avaliação por parte das suas pacientes que os seus pares de género masculino.
A justificação, especula-se, talvez esteja no grau de exigência que se tem com as mulheres médicas.
Queremo-las simpáticas, gentis, e uma série de outras coisas que talvez não exijamos aos homens porque, na verdade, em termos sociais também é para isto que estamos condicionados – a mulher tem de sorrir para ser simpática e não deixar ninguém desconfortável.
Parece ainda existir um viés que reforça estas diferenças quando se trata de cirurgias, com os médicos homens a ser tidos como “tecnicamente mais competentes” – um estereótipo que afecta diretamente a saúde mental das jovens estudantes nas áreas de cirurgia.
Pergunto-me se na base disto não está uma construção social de género daquelas que nos diz que os rapazes podem ser pilotos e as miúdas vão para assistentes de bordo, que eles são bons a matemática e elas a humanidades, ou ainda – diretamente do século passado – que eles são médicos e elas enfermeiras.
E é mesmo interessante perceber que entre a classe médica, segundo o Medscape Physician Compensation Report de 2017, a especialidade mais mal paga é Pediatria onde, adivinhem!, a maioria dos profissionais são do sexo feminino. Dá que pensar?…
Porém há um facto curioso: nos E.U.A – onde o intervalo salarial entre ginecologistas homens e mulheres há poucos anos rondava os 36.000USD anuais (a favor deles, claro) – os ginecologistas homens estão a desaparecer apesar de ocuparem a maior parte das posições de chefia relacionadas com a área (como parece acontecer com tantas outras e em tantos outros países).
Estima-se que dentro de uma década sejam apenas um terço do total de profissionais nesta especialidade. Serão sinais dos tempos americanos, do feminismo de 4ª vaga?
E por cá, como estamos? Haverá dados sobre isto?
Será que continuamos a tomar decisões com base em construções sociais que nos ficaram no subconsciente em termos de género quando toca a fazermos a escolha de um ou uma ginecologista?
Que argumentos nos apresentamos mentalmente para essa escolha? Contribuem para agravar disparidades na discussão da igualdade de género?
Numa época em que a discussão da menstruação se quer global e inclusiva, e caminhamos para um futuro menstrual que pertence a quem tem útero e ovários, como compatibilizar isso com este possível afunilamento de género dos profissionais que nos prestam cuidados?
Não sei responder mas vou pensar no assunto.
Espero que vocês também.
Bons ciclos!