Descomplicar a menstruação

Algumas pessoas lembrar-se-ão do dia exato do seu primeiro período, seja porque há uma qualquer peripécia envolvida que gerou alguma vergonha, seja porque a sua chegada resultou num qualquer impedimento ou em reações inesperadas nas pessoas em volta. Quem não se recorda, terá pelo menos uma vaga ideia de como foram os seus primeiros anos menstruais, sobretudo se tiverem sido atípicos ou causa para iniciar a pílula.

A realidade das adolescentes hoje não é muito diferente, e é por isso que, em pleno século XXI, ainda há trabalho para fazer no sentido de descomplicar a menstruação já que insistimos em usar narrativas sociais que estão obsoletas e não servem para nada.

Exemplo disso é o uso destas frases feitas:

  • Já és uma mulher.
  • Parabéns!
  • Agora, o período vem-te todos os meses.
  • É normal ter dores. É para te preparares para o parto.
  • O período serve para fazer bebés. Tens de ter cuidado!

Se nos colocarmos na pele de uma miúda de 12 anos acabada de receber o seu primeiro período, de que forma é que contribuem para que entenda o que acabou de acontecer? Qual destas frases tem utilidade imediata e faz a diferença naquele momento?  

Se respondeu nenhuma, está correta.

Pelo menos, é o que elas – as miúdas – me dizem. E temos de ouvi-las.

Como descomplicar a menstruação?

Descomplicar a menstruação passa primeiramente por lhe dar um enquadramento que seja compreensível e útil para que quem a recebe saiba ao que vai, o que esperar e como a gerir, agora e não daqui a 15 anos.

3 passos para simplificar:

1. Não tratar a menstruação como algo avulso, mas, sim, como parte integrante do ciclo menstrual. O ciclo é um barómetro de saúde.

A chegada da menarca (primeira menstruação) começa por sinalizar que aquele corpo está a crescer saudável. Os ciclos seguintes desenham-nos um quadro geral de saúde, apontando caminhos e necessidade de ajustes em termos de estilo de vida.

2. Deixar de culpar “as hormonas” por tudo o que acontece.

É verdade que o corpo na puberdade está ao rubro com elas e que são responsáveis por muito coisa, mas um cérebro adolescente está também a mil à hora, com horários de sono trocados, uma alimentação pouco equilibrada, entre junk food e as primeiras dietas do bikini, exercício físico feito a mais ou menos, etc.. Tudo são fatores que infelizmente normalizámos na vida de uma adolescente e que têm impacto no ciclo menstrual.

Compreender o que é suposto esperar dos ciclos nos primeiros anos, para perceber de que forma podemos apoiar o corpo a gerir a montanha russa de alterações em que se encontra, é crucial para não acabarmos a medicar desnecessariamente um corpo em crescimento e encontrarmos diagnósticos atempados, quando eles existem.

3. Lembrar que o conteúdo das aulas de ciências não resolve o estigma à volta deste assunto. Isso é trabalho de todos nós, e dos que têm filhos e filhas. Atualizarmo-nos sobre o tema para o podermos entender e normalizar é contribuir para libertar as raparigas e toda a gente que menstrua, de mitos, secretismos e obstáculos a uma vivência de corpo responsável e feliz.

artigo para SimplyFlow.pt | 29/09/2021