Depois do aborto espontâneo

Há uns dias fiz um post sobre aborto espontâneo.

Para quem, como eu, vê dezenas de gravidezes tomarem forma ainda em gráfico (que é como quem diz “muito cedo”) é comum assistir a perdas…

Na outra publicação falei da importância da partilha destas experiências porque elas são comuns e não estão relacionadas com a nossa “competência” enquanto mulheres.

Hoje venho falar-vos de uma outra questão habitualmente desconsiderada nestes casos: a importância de se procurar ajuda para ultrapassar a dor. A auto-culpabilização e a incapacidade de integrar o evento da perda de forma equilibrada influenciam de forma negativa não só a possibilidade de uma nova gravidez como o decurso da mesma quando acontece. Níveis elevados de ansiedade, desesperança e baixa auto-estima corporal resultam em bloqueios que precisam ser endereçados de forma séria.

As mulheres não passam por um aborto espontâneo todas da mesma forma do ponto de vista emocional. A química corporal por ação das hormonas costuma estar alterada nestas fases, o que também pode dificultar o processamento imediato do evento mas se te sentes “estagnada”, se a dor não passa e a sensação de esmagamento ou incapacidade geral se instala, deves procurar ajuda.

Fica atenta se com o passar do tempo:

  • te sentes cada vez mais deprimida e incapaz de reagir de forma equilibrada ao evento da perda e/ou à vida em geral
  • a sensação de perda atinge outras áreas da tua vida e experimentas um medo injustificado de perder coisas, pessoas, o emprego, etc.
  • crias ressentimentos relativamente ao teu parceiro/marido por
    • sentires que não te dá o apoio que precisas
    • achares que não sofre tanto como tu com o que aconteceu
  • pequenos apontamentos quotidianos fazem-te relembrar a perda e empurram-te para um estado de tristeza de onde te é difícil sair
  • perdeste a confiança em ti e no teu corpo
  • achas que nunca vais conseguir ser mãe

É importante ainda teres em conta que, por vezes, os amigos – mesmo os bons – não sabem o que dizer (e isto pode resultar em “conselhos” que te parecem idiotas ou que te melindram e afastam dessas pessoas). Compreende que isso não significa que não sintam por ti e não se preocupem. Talvez tenhas apenas de procurar apoio entre quem tem ferramentas para te ajudar de forma efetiva.

Por fim, quero dizer-te que ultrapassar a dor não passa obrigatoriamente por esquecer o que aconteceu mas sim por integrar a experiência em termos psico-emocionais, permitindo-te restabelecer uma relação saudável contigo e com o teu corpo para que a vida prossiga.

Termino este post com dois dos vários casos que acompanhei no último ano, em discurso direto, deixando um profundo agradecimento a estas mulheres por me terem permitido esta partilha convosco.

Espero que sirvam para te ajudar.

Em Junho de 2016 sofri do meu primeiro aborto espontâneo as 7s de gravidez e ficou retido até as 12s até haver a expulsão… era a minha primeira gravidez não queria acreditar porque comigo….foram os piores meses da minha vida. Tentei fazer uma vida minimamente normal após o aborto, arranjar distrações, atividades mas era impossível…. não engravidei logo de seguida então já pensava que tinha um problema… tinham passado meses mas se me falassem em aborto a mágoa vinha e as lágrimas também.
Entretanto conheci a Patrícia, conheci o seu trabalho e em janeiro deste ano (2017)  fiz o workshop CP1… foi um dia completo e vim de lá fascinadíssima…
Engravidei logo após o CP1. Estava radiante até que uns dias depois vem um corrimento rosado… fiquei assustadíssima, só chorava, fui a uma urgência mas nada deu para ver porque ainda era muito cedo só estava de umas possíveis 4 semanas… Ía mandando mensagens à Patrícia e as palavras dela tranquilizavam tanto o meu coração. Até que se confirmou o que eu não queria: tinha uma gravidez sem embrião…  o mundo tinha caído em cima da minha cabeça… estava lá no fundo do poço tantos sonhos tantos planos, porquê novamente a mim… só posso ter um problema.
Entre a perda de sangue que tive e a confirmação da gravidez anembrionária fiz uma sessão com a Patrícia através do skype e fez-me tão bem… ela fez-me ver como é importante olharmos para dentro e não ao nosso redor….como estava tão angustiada queria mais sair deste meu corpo do que olhar para ele e ainda para mais para dentro…. disse à Patrícia “quero acelerar o processo mas ainda não aconteceu nada” e ela diz-me “minha querida, (…) dizeres que queres acelerar o processo não resulta se não te libertares da ideia desta gravidez; cria espaço e deixa ir”… pois bem, nesse próprio dia escrevi uma carta ao meu filho que estava a partir, chorei tanto mas tanto mas tanto mas senti sim que foi uma despedida… fiquei aliviada. No dia seguinte estava com um corrimento acastanhado quando vi fiquei “contente”… eu estava a aceitar, eu estava a deixar ir o que tinha que ir… podem não acreditar mas foi mágico… o poder da mente é extraordinário e tal como a Patrícia diz “o nosso corpo é uma máquina extraordinária de eficiência” (…)
Engravidei logo no ciclo após o aborto, não estava nadaaaa à espera mas a verdade é que resolvi bem os meus abortos embora tenham sido dolorosos psicologicamente ficaram lá atrás e a ajuda da Patrícia foi fundamental para confiar no meu corpo é saber que embora tenha sido o segundo eu não tinha nenhum problema.
Estou grávida de 20s hoje, espero uma Carolina com muito amor para dar mas só estou a conseguir viver esta gravidez com tanta serenidade devido ao meu percurso, devido aos meus dois bebés que não nasceram, não quero apagar da minha história porque já faz parte da pessoa que sou hoje …..todas nós somos capazes apesar destas dores que a vida nos proporciona (…) mas eu tenho que confiar no meu corpo é acreditar que ele só me protege e com alguém diz…. “é uma máquina extraordinária de eficiência” aconteça o que acontecer temos que olhar para dentro e não para fora.
Obrigado Patrícia, sem ti não era possível este pensamento sereno e esta autoconfiança que sinto tão genuinamente ❤️Cátia Mercier

 

Resolvi ser mãe. Digo resolvi porque já há muitos anos que pensava nisso mas conheci a Patrícia e pensei: “antes de andar aqui a tentar, quero perceber como é que “isto” funciona. Tive uma sessão online e fiquei abismada por ter 29 anos e não saber metade do funcionamento do corpo da mulher. Engravidei no mês seguinte e abortei às 4 semanas e 5 dias… Fiquei de rastos. Falei novamente com a Patrícia e ela explicou-me possíveis razões e o mais importante: não ter pressa, perceber o corpo e relaxar. Precisei mesmo de psicofármaco do qual faço ainda desmame e agradeço todas as ajudas principalmente da querida Patrícia que teve uma paciência inesgotável.
Passados 9 meses estou grávida, não sei como será mas sei que o meu corpo está a funcionar, só preciso de relaxar e ouvi-lo, sem pressas…
O aborto foi uma dura aprendizagem mas serei agora outra mulher, e só tenho de agradecer esta aprendizagem maravilhosa e contínua à fantástica educadora que é a Patrícia. Confiem meninas, vivam e conversem com as amigas, descobri que muitas já tiveram abortos mas calaram-se.” (este testemunho ainda é anónimo porque a notícia da nova gravidez ainda não chegou a todos)

Às que têm uma história só sua, um abraço forte e lembrem-se que há ajuda para lidar com a perda. Não estão sozinhas ?