A quem cabe a gestão da fertilidade?

Fazer a gestão da fertilidade significa planear, organizar e controlar as probabilidades de gravidez, de acordo com intenção de cada um.

Há mais de uma década que ouço queixas sobre o fardo da contraceção recair sempre na mulher.

Se por um lado, não me choca ser a pessoa que corre maior risco a ter de se acautelar, o que é facto é que há mais de uma década que não vejo grande coisa mudar.

Esperamos ansiosamente a chegada da “pílula masculina”, como se ela viesse resolver de vez este assunto.

E com isto vamos andando na ilusão que não temos de fazer nada para que as coisas mudem, ao invés de começarmos a dizer que “não” aquilo que não queremos.

Elas por eles

Quando falamos de gestão de fertilidade (e vou ter de usar um discurso completamente heteronormativo aqui) há coisas curiosas de observar.
Reparem:

Porque é que eles se recusam a usar preservativo?
Porque podem (leia-se, alguém cederá a uma relação desprotegida, a um coito interrompido, ou arranjará uma outra solução).

E porque é que não tomam a vacina do HPV apesar de serem grandes propagadores do vírus?
Porque não foram sensibilizados para a questão (nem os seus pais, enquanto eles eram ainda adolescentes).

Alguma ideia sobre o adiar (ou a recusa) em fazer um espermograma?
Porque, apesar de um bebé ser feito a dois, ninguém os responsabiliza da mesma forma no que toca a exames pré-natais.

E porque é que a relação sexual penetrativa termina com um orgasmo dele?
Porque é o que se espera como resultado do ato em si, da sua perspetiva.

Em que corpo se intervém em procriação medicamente assistida quando o esperma não tem qualidade?
No delas.

E em que corpo se termina uma gravidez que é indesejada por ambos?
No delas.

E porque é que continuamos a não falar de vasectomias quando os casais não querem mais filhos?
Adivinhem…

Enfim, os exemplos multiplicam-se.

Ou elas por elas?

Claramente ainda há muito a aprender com eles no que toca a fazer valer o direito a dizer que “não”, sobretudo quando não se tem certezas ou não se sente segurança nas opções que estão a ser oferecidas.

Isto não se resolve com um “elas contra eles”, mas sim com um “elas por elas”.

Mulheres a advogarem por si próprias, avaliando custo-benefício das suas escolhas, não cedendo quando confrontadas com a possibilidade de fazer perigar a sua saúde mental ou física.

Precisamos de exigir mais (informação e opções) e de fazer mais perguntas.
De dizer “não” mais vezes ao que não entendemos, não queremos ou nos faz mal.

Ensinar as mulheres a salvaguardar a sua integridade corporal, só pode levar-nos a um sítio melhor.
A todos.

Estamos em 2024! Vamos a isto?